<font color=0093dd>Tribuna do Congresso</font>
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Reflexão e confronto com a prática
Um Congresso do PCP constitui sempre um momento extremamente valioso de reflexão, de estudo, aprofundamento de conhecimentos e, simultaneamente, a confrontação com a experiência prática de cada militante no que concerne à actividade passada e às posições do Partido. Não se confina aos três dias do início de Dezembro próximo em que este se realizará, mas estende-se por meses de discussão e preparação, que se traduzem num enriquecimento e fortalecimento do Partido.
Neste sentido parece-me de muita importância a abordagem de dois temas que, não estando ausentes do projecto de resolução política, devem ser realçados, não só pela significado histórico que já têm, mas porque encerram em si mesmos ensinamentos que podem e devem ser aproveitados no futuro.
O primeiro prende-se com a análise, o acerto de decisão e o papel imprescindível do PCP nesta nova fase política que atravessamos no País. Partindo dos últimos anos da luta intensa dos trabalhadores e do povo contra uma não menos intensa ofensiva da política de direita, luta em que os comunistas tiveram um papel decisivo e insubstituível, em 4 de Outubro de 2015, o povo português confirmou a derrota do governo PSD e CDS, retirando-lhes 700 mil votos, 25 deputados e passando esses partidos de quase 51% dos votos obtidos em 2011 para pouco mais de 37%.
À atitude passiva e derrotista do PS, perante a tentativa de PSD e CDS de transformarem a derrota eleitoral sofrida em pretensa vitória, o PCP respondeu estando à altura das suas responsabilidades para com os trabalhadores, o povo e o País e tomou a iniciativa para a construção duma solução, que não sendo nem de perto nem de longe a sua, invertesse o caminho do roubo de direitos e rendimentos, e que iniciou o caminho da devolução dos mesmos, constituindo um vislumbre da esperança para o País e a comprovação de que as inevitabilidades do empobrecimento e da exploração são falsas, assim queiram os trabalhadores e o povo.
Acabou a discussão diária do que mais seria roubado ao povo para se discutir aquilo que já foi e ainda será devolvido. O compromisso do PCP é, e será sempre, com os trabalhadores e o povo, e a actual solução governativa, este governo do PS, com o seu programa, durará tanto tempo quanto aquele em que se concretizem medidas concretas para a inversão do esbulho sofrido nos últimos anos.
Um segundo aspecto há a salientar: na experiência recente também se comprovou, novamente, que a luta dos trabalhadores e do povo é o factor imprescindível. Assim foi com os trabalhadores da Administração Local que, ainda antes desta solução governativa que repôs as 35 horas semanais a quem as tinha na Administração Pública, as reconquistaram pela luta em muitas autarquias. Também os muitos processos de luta em empresas do sector privado devem ser valorizados. Contra todas as adversidades, nos últimos quatro anos, por força da luta, muitos trabalhadores com vínculos precários, temporários, foram integrados nos quadros das empresas onde efectivamente laboravam. Com a luta organizada dos trabalhadores houve empresas que, em relação ao pagamento do trabalho suplementar, não conseguiram aplicar as alterações nefastas ao Código do Trabalho. Em muitos outros casos, pela luta organizada, os trabalhadores obrigaram os patrões a aumentar os salários, numa altura em que o governo do PSD e do CDS cortava salários, prestações sociais, nos serviços públicos, e outros. A resistência, a luta organizada e os resultados em torno das questões concretas dos trabalhadores, são a materialização concreta de que é possível transformar. De que é possível um mundo mais justo.
Miguel Silva
A agricultura familiar
No âmbito da preparação do XX Congresso a discussão do nosso aparelho produtivo, da sua situação e do caminho necessário vê-se reflectido no projecto de teses apresentado. Como é dito, no caso da agricultura «a Reforma da PAC 2014-2020 não resolveu os problemas das anteriores reformas e representou uma derrota para a agricultura e o País».
A agricultura capitalista visando o lucro fácil encharca o mercado com produtos alimentares saturados de hormonas, nitrofuranos e produtos químicos que todos sabemos prejudicam gravemente a saúde pública aliado aos elevados ritmos de trabalho e ao empobrecimento das camadas trabalhadoras estão na base de uma panóplia de doenças como a obesidade, diabetes, cancerígenas, cardíacas, que provocam a morte e os tratamentos, muitas vezes paliativos, são caros para os doentes e para o Estado.
A familiar produz alimentos de qualidade adequados à nossa dieta e segurança alimentar e nutricional e se devidamente apoiada impulsionará a melhoria da qualidade de vida e bem-estar da comunidade rural. É a agricultura familiar que melhor defende o nosso riquíssimo património genético animal e vegetal e cria resistências naturais ao avanço dos incêndios florestais que no Verão dizimam milhares de hectares da nossa floresta com avultados custos económicos e de vidas humanas. À medida que a agricultura familiar vai sendo liquidada aumenta a fome, a desertificação do mundo rural e os incêndios florestais com as correspondentes consequências sociais e económicas.
Apesar de ignorados pela então ministra da agricultura e agora presidente do CDS, Assunção Cristas, a Carta e o Estatuto da agricultura familiar aprovados pelos cerca de 3000 agricultores no VII Congresso da CNA, realizado no Ano Internacional da Agricultura Familiar, são importantes contributos da lavoura nacional para a caracterização e identificação do agricultor familiar e avança com propostas e reivindicações de políticas públicas pelo desenvolvimento da agricultura e o progresso do mundo rural.
Para o desenvolvimento de Portugal e da nossa qualidade de vida é preciso continuar a luta em defesa da agricultura familiar e enfrentar os interesses do agro-negócio das empresas capitalistas que dominam os mercados mundiais e através das mais intensas campanhas promocionais e de marketing determinam e alteram os hábitos alimentares da nossa população.
Impõe-se reformular esta política que promove o abandono da produção e tem levado ao desaparecimento de milhares de explorações agrícolas de pequena e média dimensão. O Partido sempre esteve ao lado dos camponeses e da lavoura, sendo uma voz inconformada na defesa da produção nacional criticando as políticas de concentração capitalista e propondo medidas concretas de defesa da nossa agricultura. Sempre solidário com a intensa luta dos agricultores e da comunidade rural em tantas e importantes lutas na defesa dos baldios, na defesa dos laboratórios e serviços públicos, pelo direito de produzir, contra a eliminação das cotas leiteiras, contra as absurdas exigências da fiscalidade à agricultura familiar, pela diminuição do preço dos fatores de produção e pelo escoamento dos produtos a preços compensatórios.
Os agricultores têm no PCP o partido que melhor sabe interpretar e defender os seus reais interesses e que nunca desiste, tanto nas instituições como na sua luta de todos os dias, como se expressa no projecto de teses em torno da política alternativa patriótica e de esquerda.
Aníbal Cabral
Dúvidas e interrogações suscitadas
pelo projecto de resolução política
O projeto de Resolução Política tornado público para apreciação pelos militantes do nosso Partido é um documento demasiado abrangente e complexo para que no espaço de uma carta à Tribuna do Congresso possa emitir uma opinião fundamentada sobre muitos dos temas nele tratados. Limitar-me-ei por isso a breves linhas sobre algumas questões.
A primeira parte do Capítulo I – Situação Internacional – até à página 10 diferencia-se da generalidade do documento pelo conteúdo e pela clareza da linguagem. Não direi o mesmo dos parágrafos sobre o movimento comunista internacional. Não vejo como o PCP possa contribuir para «o fortalecimento, a unidade e o incremento da capacidade de ação do movimento comunista e revolucionário internacional» com a sua posição face ao que chama «concepções e práticas dogmáticas e sectárias» que atribui a partidos irmãos (págs. 14 e 15).
O Capítulo 2 – Situação Nacional – transmite sobre a crise da União Europeia, a submissão ao euro e os entendimentos que levaram a direção central do Partido a viabilizar o governo do PS, uma reflexão em que esta reafirma somente posições que tem repetido exaustivamente. O espaço dedicado à situação económica do País deixa transparecer insuficiência de trabalho coletivo e falta de rigor. Idem quanto à ofensiva contra o regime «democrático» (que está longe de o ser) e a Constituição.
Na temática relativa à função social do Estado registo a ausência da caracterização do Estado da burguesia como instrumento de repressão ao serviço da classe dominante.
Saliento passagens positivas na análise da ofensiva ideológica (pag.46 e 47).
Preocupa-me porém a posição assumida na «proposta de alternativa patriótica e de esquerda» e os seus objetivos centrais. Afirma-se que estes são claros e se enquadram no Programa do PCP cuja meta é a construção de uma sociedade socialista em Portugal (págs. 46 e 47). O tema é retomado nos Capítulos 3 e 4.
A perspetiva esboçada é reformista e choca-se com o marxismo-leninismo, ideologia assumida pelo PCP.
A nossa época não se assemelha à dos anos em que Marx e Lenin – em contextos históricos aliás diferentes – sem rejeitar a luta por reformas, iluminaram o fosso intransponível que separa o reformismo da atitude revolucionária.
O marxismo não é estático. A grandeza do leninismo é identificável precisamente pela capacidade de Lenin para inovar como estratego e tático, mantendo uma fidelidade intransigente a princípios, valores e lições do marxismo.
Não encontrei essa atitude nas páginas da Resolução dedicadas à política patriótica e de esquerda na luta pelo socialismo.
A direção central reafirma considerar prioritária a luta de massas no combate pela rutura com a política de direita, mas não o demonstra com a sua estratégia parlamentar, definição da política de alianças e abertura a um «frentismo» confuso e a cedências.
Lamento o abuso da palavra «exigência» – vulgarizada na linguagem política portuguesa por Passos Coelho e os seus ministros – nas páginas 69 e 70.
Distancio-me, sublinho, do otimismo que transparece nas passagens relativas à preparação do Congresso.
Milito no PCP há mais de meio século. Foram as lutas em que participei como comunista que conferiram significado à minha passagem pela vida. É nessa condição que termino desejando que o XX Congresso possa apontar ao Partido o rumo que Álvaro Cunhal tão exemplarmente contribuiu para lhe imprimir na fidelidade à tradição revolucionária da sua gloriosa história.
Miguel Urbano Rodrigues
Não basta comprar o Avante!
Já lá vai o tempo em que o poder estava na ponta das baionetas. Agora está, sobretudo, na televisão, nos diversos tipos de computadores que incluem até os telemóveis, na rádio e nos jornais. Ou seja, nos órgãos de comunicação social. Por isso, os capitalistas os detêm e controlam para alienar as massas. Para, assim, muito melhor as submeterem à exploração e para o imperialismo as preparar para as suas guerras de domínio e rapina.
E o melhor antídoto a essa influência avassaladora baseada na distração, na sonegação, na deturpação e na mentira, é ler-se o Avante!. Vem isto a propósito, e principalmente o título deste meu escrito, porque há tantos camaradas e amigos que o compram, até impreterivelmente todas as semanas, mas depois passam os olhos pela primeira página e/ou pelos títulos, e ficam-se por aí. E é imprescindível lê-lo para andarmos bem informados.
Podia aqui dar dezenas ou centenas de exemplos, mas porque não posso nem devo monopolizar este precioso espaço, fico-me sinteticamente apenas por três. Por exemplo, quem é que já tinha alguma vez ouvido falar no CETA? Pois bem, como o seu «pai», o TTIP, por ser tão evidentemente mau, marca passo, o grande capital avança com esta golpada para a qual o camarada Ângelo Alves nos alerta na edição de 20.10, com mais uma boa achega na página 21, e porque é que esta aberração também patina.
Segundo exemplo também na mesma edição: o grande seminário sobre «A Crise na e da União Europeia», organizado pelo PCP e pelo Grupo Confederal da Esquerda Unitária/Esquerda Verde Nórdica no Parlamento Europeu, em Lisboa a 14.10 (a que eu, indesculpavelmente, por tão ter anotado bem, faltei). Quem é que falou mais desta oportuna e utilíssima iniciativa a não ser o Avante!? Eu não vi nem ouvi nada!
Por último, e para me ficar por aqui: quem é que desmascara mais esta hipócrita diabolização de Putin pelo facto de a Rússia impedir que o imperialismo norte-americano, mais os seus aliados (onde pontificam a UE e a NATO), tal como fizeram à Jugoslávia, ao Afeganistão, ao Iraque e à Líbia, derrubem o seu legítimo governo e destruam a Síria, se não o Avante!?
Portanto, camaradas e amigos, não basta comprar o Avante!. Há que lê-lo! Para podermos mais eficazmente passarmos a nossa mensagem e desmascararmos os embustes da gigantesca máquina mediática do capitalismo e do imperialismo, junto dos nossos conhecidos, vizinhos, amigos, e, os que tiverem condições para isso, nas redes sociais e blogues e nos programas interativos de rádio e televisão.
Francisco Ramalho
Reflexões de todo o tempo
em tempo de Congresso
Há que clarificar algumas questões teóricas fulcrais. Não como certezas imutáveis porque a vida não pára e nós queremos intervir na sua mudança, nas transformações do mundo. Como é nosso humano devir e nosso dever de comunistas. Em tempo de Congresso e entre congressos, isto é, sempre!
Não se trata de terminologia. Cada palavra é um conceito e tem um significado (ou vários) com carga ideológica para quem a escreve, para quem a lê. Nelas, e nas frases que compõem, temos de procurar a coerência com a nossa base teórica por mais que escorreguemos (todos!) no seu uso corrente, marcado, evidentemente, pela ideologia dominante.
Quanto ao uso da expressão crise do capitalismo venho persistindo na ideia de que o funcionamento do sistema capitalista é permanente fautor de chamadas crises, ou seja, que o capitalismo funciona em crise por não poder superar as contradições que o seu funcionamento gera, o que provoca que a crise sempre latente passe, periodicamente, por picos ou saltos qualitativos, que muitos autores já procuraram periodizar com teorias de ciclos. Algumas muito interessantes como tema de estudo e aprofundamento, nunca como argumentos de autoridade.
No mesmo sentido, reflicto sobre a formulação O socialismo, a alternativa do capitalismo (e idênticas ou dela derivadas). O socialismo não é alternativa do (ou ao) capitalismo mas a sua superação revolucionária. Em materialismo histórico não se coloca a alternativa ou capitalismo ou socialismo; há, sim, alternativas políticas e políticas alternativas «dentro» da correlação de forças sociais em que o capitalismo é formação social dominante, dominância condicionada pelo estádio da luta de classes.
Pelo que, em documentos exigentes ideologicamente, será de não usar a expressão outras classes. Na nossa conceptologia, classes tem um significado preciso, sendo o PCP o partido da classe operária e de todos os trabalhadores portugueses, gerada por uma outra classe, a exploradora (a «classe burguesa», segundo os nossos clássicos). São as duas faces de uma luta de classes, para que não são indiferentes, pelo contrário, camadas e grupos sociais, as populações em geral.
Na falta de organização de classe, como vanguarda da classe operária e de todos os trabalhadores, a classe e as massas em geral de que ela faz parte estarão desarmadas da sua grande força mobilizadora para a luta que lhes é vital, do pólo colectivo e com rumo capaz de inserir as lutas de hoje na luta de sempre.
Exemplos contemporâneos não escasseariam, mormente pela negativa, com tantos casos de lutas locais e pontuais sem perspectiva histórica, permeáveis ao imediatismo e ao caudilhismo (ou nosso sebastianismo). Mas há também alguns exemplos pela positiva, e neles se inclui o partido de que somos militantes, o Partido Comunista Português que continua, pela sua identidade e base teórica, a impedir que a insuportabilidade da exploração, o descontentamento e vontade de mudança das massas sejam manipulados e até pervertidos, na ausência de consciência histórica e na fragilidade da vertente ideológica da luta de classes. O que torna imperioso o reforço da teoria revolucionária para que a prática o seja.
Em vésperas de Congresso onde se afirmará, de novo, a importância da ideologia, da informação e formação dos militantes, uma última nota, de preocupação: que não se confundam estas considerações com vestígio sequer de intenção de privilegiar o trabalho intelectual, mas sim de o unir à militância partidária e para ela contribuir como parte indispensável do trabalho colectivo.
Sérgio Ribeiro